Quem lê pela primeira vez a versão original de Viagens de Gulliver, tendo como pano de fundo uma vaga lembrança de adaptações infantis, espanta-se ao constatar que tem nas mãos um dos textos mais amargos do cânone ocidental. Como observa George Orwell no prefácio incluído nesta edição, o livro de Jonathan Swift, apesar de todo o seu ressentimento e misantropia, é uma obra deliciosa, que permite vários níveis de leitura. É primeiro um livro de viagens - ou melhor, uma sátira aos livros de viagens, tal como Dom Quixote é, entre outras coisas, uma sátira aos romances de cavalaria; para as crianças, é uma história de aventuras, cheia das criaturas fantásticas e do humor escatológico de que tanto gostam; e é um dos marcos iniciais da ficção científica. Entretanto, o que mais fascina o leitor maduro nessa obra publicada pela primeira vez em 1726 é o olhar implacável que seu autor volta sobre o homem, suas instituições, seu apego irracional ao poder e ao ouro, e sua insistência em prolongar a vida mesmo quando esta só proporciona sofrimento. Esta edição de Viagens de Gulliver foi organizada pelo professor Robert DeMaria Jr., também responsável pelo texto de introdução e pelas notas, e conta com imagens preciosas, como reproduções da folha de rosto e do frontispício da primeira edição da obra-prima de Jonathan Swift, além de mapas das diferentes terras citadas no romance, inestimáveis para a leitura.